A escola de Salerno

Por volta do século X foi criada em Salerno uma Civitas Hippocratica, uma comunidade de médicos que estudava, compendiava e ensinava a medicina. Tratava-se de um centro laico, embora em estreita ligação com o mosteiro de Montecassino. Pouco se sabe da sua fundação, à exceção de uma lenda que a atribuía a quatro médicos, Ponto (grego), Helinus (judeu), Adela (árabe) e Salernus (latino), a qual, reflete as influências culturais presentes. As primeiras figuras da escola foram Garioponto (c. 970-1050), autor de uma epítome de textos bizantinos denominado Passionarius Galeni e Alfano (c. 1015-1085), médico que aprendeu em Montecassino e foi arcebispo de Salerno, cuja obra é igualmente de influência bizantina e greco-síria. A influência médica árabe e o consequente amadurecimento da personalidade própria do Studium Salernitanum dá-se em finais do século XI com Constantino o Africano (c. 1020-1087). Natural de Cartago, dedicou-se ao comércio de drogas e viajou entre o Oriente e a Europa até se instalar em Salerno, trazendo consigo uma seleção de vários manuscritos médicos árabes. Munido de uma carta de recomendação do arcebispo Alfano, foi recebido no mosteiro de Montecassino, onde se converteu ao cristianismo. Na qualidade de irmão leigo, traduziu várias obras médicas importantes do árabe para o latim, num total de cerca de três dezenas de textos, durante os anos seguintes.

Das obras nascidas da Escola de Salerno durante os séculos XII e XIII, destacamos apenas algumas. O Tractatus de aegritudinum curatione é uma obra coletiva onde se reúnem os ensinamentos sobre medicina geral de vários mestres de Salerno. As doenças encontram-se dispostas na ordem já referida da cabeça aos pés. Entre os autores citados, encontra-se uma mulher, Trotula, a quem se deverá parte da obra De passionibus mulierum, que trata de ginecologia, obstetrícia e cosmética. O conjunto dos ensinamentos ministrados aos estudantes de Salerno encontram-se patentes nas diferentes versões das Articella, um conjunto de textos didáticos que incluem normalmente a Isagoge de Johanitius, a In arte parva de Galeno, o Prognostikón de Hipócrates, o Liber pulsum de Philaretros e o Liber urinarum de Teophilus. Algumas versões incluem outros textos, como os Aforismos de Hipócrates e parte do Canon de Avicena. As Articella influenciaram grandemente o ensino médico por toda a Europa, constituindo o corpo de doutrina médica utilizado inicialmente nas Universidades e foram impressas pela primeira vez em Pádua em 1476. Muito conhecido foi também o Regimen Sanitatis Salernitanus ou Flos medicinae (c. 1300), um grande poema com cerca de 360 versos, de que se conhecem três centenas de edições em várias línguas, sendo a primeira impressa a de Pisa, em 1484. Inclui um conjunto de conselhos relativos a higiene e saúde que tiveram grande e prolongada influência, tanto na medicina erudita como na popular.

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